Manifestação ou autoritarismo?

timO ENEM parece ser o caminho para a democratização do ensino superior de qualidade, como já afirmei. E, mais uma vez, desde a sua criação, está envolvido em polêmica. Agora, a mais triste de todas.

Jovens ocupam escolas e universidades, como forma de “manifestação” contra a reforma do ensino médio e contra a PEC 241 (que agora foi para o Senado e passou a ser a PEC 55), prejudicando os alunos que querem estudar e a realização do ENEM. Por que o direito de manifestação dessas pessoas prevalece sobre o direito de outras tantas de estudar e fazer as provas que vão lhes garantir o acesso à universidade?

É aterrador ver a UBES afirmar que o número de estudantes prejudicados no ENEM é pequeno — 3% do total, ou “apenas” 240 mil pessoas. Acham pouco? Não sei o número de pessoas que estão “ocupando” os locais de provas do ENEM, mas duvido que seja um número tão significativo. É um absurdo que uma minoria prejudique tanta gente!

Ora, numa democracia, as manifestações político-populares são necessárias e imprescindíveis, todos sabemos disso. Aquelas que influenciaram o processo de impeachment da ex-presidente Dilma ocorriam aos domingos e feriados, sem prejudicar dias letivos e de trabalho. O trabalhador comum, empregado, podia manifestar-se sem prejudicar a empresa em que trabalhava, sem atrapalhar a escola dos filhos. Milhões de pessoas foram às ruas para exercer seu direito democrático à manifestação política, num horário em que poderiam desfrutar de ócio e descanso.

Como vivemos num regime verdadeiramente democrático, ninguém será preso por se manifestar politicamente. No entanto, o problema existente não é a manifestação política em si, nem o eventual mérito da causa, mas a ocupação violenta de espaços públicos, impedindo a população de se beneficiar da função das instituições de ensino. Trata-se de uma minoria que tolhe o direito da maioria — isso é ou não violência? O dicionário Caldas Aulete define violência como o “emprego abusivo, geralmente ilegítimo, da força ou da coação com o fim de se obter algo”. Ora, a ocupação de escolas nada mais é do que a aplicação de uma técnica de coação exercida por poucos jovens sobre milhares que são impedidos de estudar! Ou de fazer a prova do ENEM! Com esse resultado, a manifestação perde a legitimidade, pois assume um caráter impositivo, egoísta, não se justificando ante os prejuízos causados diretamente àqueles que alega defender.

Espera-se de jovens criatividade, mas, infelizmente, o que vemos é a repetição de técnicas intolerantes e autoritárias, nas quais se impõe a vontade de poucos sobre a necessidade de muitos. E nessa necessidade de muitos incluem-se os custos de aplicação de outras provas a esses 191 mil candidatos do ENEM prejudicados: 12 milhões de reais além do que já foi gasto.

Entristece saber que esses manifestantes não têm a menor noção sobre aquilo que reivindicam. Não sabem o que significa a tal PEC, e, provavelmente, a maioria não leu uma linha sequer da proposta. Sobre a reforma do ensino médio, alguns acham um absurdo a escola ser em período integral. Como assim? Há vídeos na internet que entrevistam ocupantes de escolas. Como sempre, são massa de manobra, repetindo desgastadas palavras de ordem impostas pelos mesmos grupos políticos que chamam o impeachment de golpe.

O brasileiro médio não está politicamente organizado em grupos, e espera que a Justiça cuide da desocupação. Se estivesse, certamente já teria havido muitos confrontos e grupos organizados já estariam fazendo manifestações contra a ocupação nas escolas. Um exemplo foi o que ocorreu em uma escola em Taguatinga-DF, onde houve confronto, com direito a bombas caseiras e coquetéis molotov. Bem, a polícia foi acionada e montou guarda no local para impedir a entrada de outras pessoas que não os invasores. É isso mesmo, caro leitor: os que impedem as aulas e a realização do ENEM são protegidos pelo poder público, quando este deveria garantir a escola livre para aulas e outras funções.

É uma pena que tantos sejam prejudicados por uns poucos indivíduos arrogantes e adeptos de uma ideologia com viés autoritário. Por sorte, são jovens: ainda têm a chance de aprender e se tornarem adultos responsáveis, honestos, trabalhadores, de se arrependerem e se envergonharem do dano causado aos colegas e a todo país. Entre outros prejuízos incalculáveis, foram desperdiçados, até agora, R$12 milhões numa época de vacas magérrimas.

Bom fim de semana procês!